Tuesday, December 08, 2020

Ao Outono

Tempo de névoas, de caudalosos frutos,

Íntimo amigo da luz madura, amena—

Com ela conspirando a bênção, os produtos

Das videiras, cingindo o friso das empenas;

Os cachos de maçãs nas copas das casinhas

E o odre de fartura desses pomos todos

De bojo pleno, as cascas de avelã cheiinhas

De doce caroço, de que despontam brotos

E flores sem conto, escorrendo para abelhas

Que chegam a pensar que o calor não cessa

De tanto que o verão os favos lhes pincela.

 

Quem não te conhece a oferta do celeiro?

Qualquer forasteiro se deparou contigo

Sentado calmamente ao centro duma eira,

O vento dos cabelos debulhando o trigo;

Ou a dormir numa seara mal mondada

À brisa de papoilas, esquecida a foice

Sobre a seguinte meda em flor traçada;

Ou tal respigador, de afogueada face

Pendente, ouvindo marulhar uma levada;

Ou num lagar de cidra, o atento semblante

A aguardar que o sumo lento se decante.

 

Que é feito da cantante Primavera? Ora,

Deixa, tu também tens as tuas melodias, —

Enquanto as nuvens dão ao tempo turva orla

E mancham de azul-rosa o restolhar dos dias;

Então rompem em coro melgas suspirosas

Sobre os chorões dos rios, que se soerguem

Ou caem consoante o vento vive ou morre;

E ovelhas balem sobre terras montanhosas;

E arvoram grilos, e trila o pintarroxo

Rasando num vibrato hortas amuradas,

E trinfam andorinhas no céu amontoadas.


John Keats


[Nota: Graças a Maria Luísa Pinheiro, tradutora de A Mitologia de Edith Hamilton, em particular do reconto do mito de Filomela, aprendi que as andorinhas trinfam e sempre achei que um dia me seria útil.]

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