Quando o homem pisou a lua no café do meu avô
eu não estava lá [escrevi sobre isto antes
por outra
causa mas (montagem, conspiração, solas
ufanas de improváveis
galochas de lustro astronómico arrastando um
pé retocado
pelo ângulo do vento bafejando ouro azul rubro
e branco
e pura Americana
forever) nem sempre há-de ser o mesmo
poema; neste o tema serve o desenho de quem
era o meu avô:
ele tinha um café e um televisor ainda raro
na altura, caixa
cúbica que todos convocou em torno ao espaço,
só eu não;
eu era ainda para nascer e por isso lamento
quando chegou
o primeiro homem à lua eu não estava lá] em
Vendas Novas
e o café ficava em frente ao quartel e os
mancebos
treinavam para ir matar no ultramar por causa
do senhor
que julgava ainda governar Portugal mas também
não esteve
lá e se calhar nem viu nada se calhar nem
ouviu se calhar
nem deu por nada mesmo supondo um rouco
transístor
seguro pela débil mão junto ao débil coração o enfermo
na cadeira de onde já tinha caído sem ter
percebido
nada desconhecendo os mancebos e estes em
paga
ignorando por uma vez tudo dele todos olhos e
reparo
todos postos no futuro todos sôfregos na
respiração
de Neil Amrstrong lá longe na lua na
televisão do Amaro
preto no branco o dominó em tampo de mármore
em câmara
lenta derrubado passado tempo guerra regime ó
leve coração
efémero o meu avô no meio do café a serradura
era neve
de botas cardadas na lua que ele limpou quando
voltou
a tropa ao quartel de fantasia em forma ele
só atencioso
ele desperto afã de cuidar de varrer como
sempre fazia
ele pepitas semi-acesas eram estrelas
fabulosas da alegria
eu não estava lá nem estive quando anos após
(eu tinha
dezoito) o coração dele parou eu soube como um
soco
a primeira vez que alguém morria a lua não
tremeu não se via
o meu avô pela sua fé sem qualquer tecnologia
tornou ao céu