Pensei imaginar-te outra vez nua entre
coisas brancas panos nuvens ovelhas e
camarinhas frutos pequeninos que os teus
dentes brancos ligeiramente inclinados
para a frente para um beijo para mim
trincam e tu tapas a boca com a mão
e cospes caroços desenhas nos lábios
um sorriso de vestal apanhada pelo sol
e tu à procura os meus olhos rasos
de assombro fundo rasos a sobrevoar-te
dentro do teu corpo maculado de ternuras
de ferida de raivas surdas de mínimos
tumores de marcas ausentes de todos
os amantes que tu não quiseste que
te quiseram morder tu não deixaste
até um dia te cansares de ser virgem
chegares a mim a tremer tu à procura
eu a detestar-te por alguém tinha de
haver alguém a quem detestar no teu
lugar em vez de ti se nem a mim ao fim
de contas tu não deixaste eu não pude
nunca tocar eu tenho os dedos brandos
mas só o silêncio grande os teus olhos
rituais mesmo assim mesmo quando
coloquei a minha cabeça no teu colo e tu
quase acreditaste e eu a querer-te vingando-
te cheiro a primavera pura nas tuas costas
dentes brancos frutos tu negaste nós as duas
a desejar que fosses talvez menos bela e tu
de desdém a beleza que te gastava tu sabias
e sabias e resignavas-te e eras um adorno
um risonho sacrifício de castidade passavas
a fingir que eras mais alta do que eu
eu consentia tu eras mais alta do que eu
e todos os que consentimos nos lembramos
de ti assim e fazem-se grandes rodas
de choro por ti e eu fico só choro-te só
a rasgar os retratos onde não apareces a
saudade dos teus gestos rendados das tuas
veias em teia à volta de dedos um rosário
de fios de lustro é assim que eu me lembro
de ti e os deuses olímpicos e os serafins
melindrados e todos quantos se lembram
de ti e ainda que se calhar nem sempre
tivesses nas mãos a claridade das violetas
eu recordo-te agora tinhas de certeza
violetas nas mãos quando foste embora
eu vi porque lá fora ainda havia dia.