Monday, September 10, 2018

Madeira

O pátio dá para os asseios da casa que a dona Aninhas aluga
aos verões, corre água no duche, vozes de dois corpos, imaginamos
novinhos, turistas daqui do Alentejo ou trabalhadores da estação
(percebe-se o sotaque nestas bandas é o sol raso à ribeira
que decresce), discutem o caso do momento — Isaías, madeireiro,
com o diabo do bagaço, pregou uma surra na noiva, a GNR pôs cobro
a ele meteu-lhe ordem de restrição, suave é a locução do banho:
Eh amor prometes que nunca me dás c’os pés?
arrepiando-se por sinistra corrente da consciência, ele:
Prometo tu sabes que ando sempre agarradinh’a ti
Onde outros se enterneceriam nós tememos pelos que
se desavêm, pedimos em surdina que nos provem o erro
e possam ficar para lá do vidro martelado da janela onde
se ouvem pingando-se afagos depois de mirrarem as peles.
Enquanto isso medimos quanto falta para o meio
da garrafa, nesta idade vigiam-se excessos por medo de cancro
em zonas melindrosas, da queima das ideias, duvidando se mais vale
a tristeza eufórica do álcool à válvula da dor que fecha mal.
Montaram uma cadeira nas dunas onde fomos – banais
afinal – deslumbrados absolutos. Sentámo-nos com a frustração
como mandam os mestres da meditação no oeste. Louvámos
os elementos que aliviam. Mas a respiração sobre o alto
da falésia estarrece. São rodeios ao que não pode ser escrito.
Podemos escrever os amores, tontos, tortos, torpes
fazer odes, elegias, sáficos troços sacrificados à grande dor de corno.
Podemos, quando se crê apesar de tudo, escorar o poema
de amantes disponíveis para atear o entorno, tentando tanto
podemos escrever a luz e as cinzas de um enlace com logros menores.
Não podemos escrever o pavor do descuido aos que daí vêm
depois (mas sim, vai resultar, está quase a passar), a responsabilidade
é nossa, a decisão deles, saberão ler, é natural, vão-nos cobrar
que se lixe, antes isso – madeira,
madeira,
madeira – que morram jovens pelos deuses que amaram.

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