não posso evitar admirar como não caem
carneirinhos
nem o resto que é de novo levantado, levado
torcido, lavado nas manchas lilases da
manhã
recém-cosida, líquida, desta hora
moiral com os braços
de frio fincados na barriga, escada onde se
alça
a mulher varejando a oliveira, rio a seguir
videiras
que são rochas preciosas recortadas de
cobre
no outono beirão, amanhece claro protegido
desta hora neste vidro do vagão, ó Ente-
-pavor, senhora disto que tremendo
se atravessa, paisagem-lustro, molhada,
verde
sede expressionista céu de cores ainda
homéricas
nasce mundo, mesmo se apoucando os dias, eu
penso me comovo mais de viço neste conforto
do que entre fios e nós e bichos por
exemplo
debaixo de árvores onde raramente se está
bem
para ler, porém os fabricantes de lápis
desenhariam
tais aparas de luz, riscos do sol,
praticamente incrível
aqui em baixo, esta hora, ainda a poder
olhar-se
como lua sobre ardósia fresca —
monstros, só podem, dum furta-fogo vasto
que envolve tudo e filtra as fundas dores
encostas cheias de trevos
musgo vertigens
impossíveis de choupos, depois arados
campos e
tudo quanto faísca, desta hora, da chuva
da noite, das sombras das pontes quando
vamos
— túnel breve afinal, desta hora, eu quero
a verdade —
tudo passa e tão tangível que tu és: claro
Divino
por quem a treliça do mundo se coloca em
marcha
renovadamente, sobre as massas mesmo os
escombros
e mesmo erros sim, consigo, cantiga, que
grite também
esta santidade de agulhas louras e de
ávidas auras
esta fartura, que até as rugas de rodas nos
bordos
de lama, as murtas pequenas, as coisas
metálicas
intrometidas nas poças extensas entre o
alto e a crosta
e o que em segredo há de ferver, que até
são portas
— laranjeiras, desta hora, e o rio como mar
a forçar
uma visão a dançar entre montanhas, as aves
nos penedos pousadas se deslumbram
certamente
também com a minha passagem
mais os balaústres de leques transparentes
que
azuis se tornam, se cruzam, pois, pontes só
carris
de patins, se cava um vale e vai rio
vai verde nele se varre película móvel de
brilhos
de arribas cada vez mais solenes coroadas
de esguios
sinalizadores álacres de óxidos raros —
dádivas, desta hora e tudo
tudo esdrúxulo ao mesmo tempo bem pensado
tudo deitado e gritando para o louvor e o
espanto
irreprimíveis, desta hora, não regateados