ao Manuel Resende
Progredia a brancura, e nós uma corrente:
era um socalco ao lado sem cume a vertente
do outro lado um abismo que havia e nós
não víamos pois era tudo branco a neve
iludia. Piso macio, desfeito, breve
a nossos pés a boca de um perigo. Nós
seguíamos na branca duna que cedia
calcada pelos pés, e aos poucos se tingia
permanecendo embora muito branca. Nós
não éramos bons nem maus, tão-só sabíamos
que doía perder-se alguém. Retrocedíamos
quando um na neve se sumia. Aflitos nós
cavávamos até a pá achar um corpo,
acalentávamos com as mãos o sangue morto
e à vida ele tornava invariável, nós
tínhamos fé; bastava não negar volver
quando um mais débil se deitava a morrer;
bastava não acreditar, pois para nós
a morte o seu rigor tirava e a brancura
se aluía, desde que, sem pesar da dura
marcha já transposta, voltássemos lá nós
a buscá-lo. Tal foi a abnegação feroz
que tão longe nos trouxe. Donde, doutor, sei
que sabe, aqui chegados, por que o não matei.
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