Descíamos de madrugada, ainda escuro, uma montanha vermelha (podia ser no Utah). Eu levava avanço e a dada altura pousava num socalco o meu carrinho de bebé e, sentada nele, a minha mala de couro, cozido aos losangos e variegado. Tinha algo de que avisar os amigos. Passava para cá um grupo de caminheiros vetustos. Quando voltava para lá, a descida era muito mais íngreme do que me parecera, o sol abrasava já blocos de terra vermelha em ângulo reto. O carrinho não estava em curva alguma do caminho. Hordas de veraneantes garimpavam agora a encosta, as suas botas descolavam grãos vermelhos da falésia (já não o Utah mas uma arriba fóssil da Galé): Ruy Belo tirara ali um perfil icónico. Finalmente no sopé havia uma caverna de Ali-Babá. Lá estava a mala, de conteúdo intacto, mas não o carrinho. A partir daqui o sonho desloca-se para a Califórnia e para o problema "do nível da água na esfera terrestre." Eu começara a ler A Divina Comédia na tradução de Marques Braga e adormecera a pesar a vantagem de substituir fatal por fetal num terceto repleto de feras.
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