À
sombra de Krishnamurti
Alimentados
à colher pelos nossos santos, temos andado doentes,
bastante
gananciosos e por conveniência sujeitos,
entidades em segunda mão, ocasionais lampejos de alegria e afeição.
Sob
tortura, a mente retalhada,
que
se furta a toda a confusão e refuta o mundo fora,
achará
apenas em conformidade com a sua distorção.
Precisamos
realizar que é a nossa imperfeita conflitualidade
que torna as relações em
ressentimento, perceber que toda a história do homem
se
inscreve em nós, e morrer para o que foi ontem;
perceber,
não intelectual mas actualmente,
que
só abdicando da respeitabilidade, nesta vida competitiva,
podemos
suspeitar da infinita realidade desmedida.
Disseram-nos
que todos os caminhos –
Cristianismo, Islamismo, Taoísmo, prática existencial da virtude –
conduzem
à verdade e se encontram a uma mesma porta;
algo
que, submetido ao teste da observação, é obviamente absurdo,
além
de que não se pode olhar através de um ecrã de palavras.
Pelo
que, não obstante a higiene do preceito
de
não deixar passar nenhum dia sem linha,
não
nos podemos fiar de que a escritura nos cura.
Mais
importante do que o traço será a abertura,
o
furo ou o recorte por onde se entra e verte e vem,
e
o têxtil não tem de ser inconsútil nem
a
urna bem lavrada, e a bailarina desmancha
os
véus e a rasgadura denuncia a usura da memória.
A
pergunta que nos colocamos é séria: há alguma coisa que se
possa fazer?
Tens
olhos: ninguém tem de te dizer para ver.
Podemos
então, tu e eu, após noite inteira de chuva
e
desenrolada no céu a manhã livre de impureza
como
se fosse a primeira, abrir,
sem
qualquer convicção exterior ou temor de castigo,
a
intensa revolução: a verdade sem a certeza vive-se
de
vária maneira, é a beleza, um espírito
leve
sem temor pode amar imenso,
havendo
o amor faz-se o que se queira
.
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