Refira-se, a bem
da afirmação da agência da mulher no trabalho artesanal, a crítica dos estudos
de género que enquadra o discurso de Steiner numa longa tradição de metáforas
de tradução que são sexistas. Desde a “bela infiel”, blague aparentemente
cunhada por d’Ablancourt no século XVII, até à equação da tarefa com um
trabalho derivativo, consequentemente feminino e mais ou menos transparente,
passando pela fantasia da violação do texto original ou da lasciva adulteração
da língua materna. A segunda e terceira fase enunciadas por Steiner, de
agressão e incorporação, descritas numa linguagem sugestiva de penetração
invasora e de inseminação que robustece, prestam-se a este tipo de crítica
(Cahmberlain 1988; Round 2005).[1]
Em todo o caso, Steiner
preferia, ao discurso de ciência sobre a tradução, uma “arte exata”, comunicada
por “relatos interruptos e episódicos” (1998 b p. 109).
[1] A bela infiel
É precisa uma
guerra que se invente
para criar – dixit
George Steiner,
misógino, ou
nisto o transfere
mais ou menos o
teu pensamento
pingando de
belicismo. O que Steiner
diz concerne, de
resto, a tradução;
no fim há – rara
– a restituição;
no meio, boas
vindas à cativa,
“A vencida Grécia
será mestra
de Roma”
assim: língua nativa
cede à espessura
da sua serva
e toma o corpo
heróico da rival
(já Haroldo se
achava canibal
mas em geral só
comia gajos).
Tu, és duma
escola mais risonha:
não lanças,
abres; não bates, reages.
Lês vísceras com ácido e peçonha
mas de princípio dá-se confiança.
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