Tuesday, July 27, 2021

Ação de Graças

Vamos deixar de querer 

que o outro nos veja o sofrimento aberto

como um animal quando?

(empratado com recheio do próprio

pássaro, vísceras 

e farofa, dose generosa de arandos

em calda para os parentes)

Tuesday, July 20, 2021

TAMBÉM ISTO PASSARÁ NÃO PASSA NADA NÃO PASSARÃO

Estava previsto que isto da rebaldaria da igualdade passasse

debalde; pelos buracos das caleiras

passo pela agulha passo dos carris

passo mercadoria grátis a autoria

a propriedade a palavra

de honra (já disse) a escravidão passo

passas mando à fava o discurso

simbólico (vai chamar

a outro) da ponta 

de Sagres não te devo um corno 

Camões nem ao americano da tirada

do verso = expansão safando Brooklyn

Bridge mostra lá a vaza as pratas

os Douradores mostra lá o peão 

que levas no porão 

passa a outro não à mesma

bluff digo duma vez APOIO TODA A FORMA

DEMOCRÁTICA DE ACUMULAÇÃO DE POESIA

 

(Deixa passar Deixa 

Deixa passar Deixa

Deixa passar Isto tudo

vai mudar Caraças

Baixa a guarda não tem que ser 

as calças Com licença Fuck the peneirice Quase tudo

Mais que as mães A dar com pau Bora conviver)

ainda que poetas na sua

formidável maioria (Gato com rabo

de fora)

não sejam flor que se cheire gente afável 

nem grande

espingarda que aproveite ler.


Thursday, July 15, 2021

[na cabeça do sonho::] da montanha vermelha, do útero arbitrário

 Descíamos de madrugada, ainda escuro, uma montanha vermelha (podia ser no Utah). Eu levava avanço e a dada altura pousava num socalco o meu carrinho de bebé e, sentada nele, a minha mala de couro, cozido aos losangos e variegado. Tinha algo de que avisar os amigos. Passava para cá um grupo de caminheiros vetustos. Quando voltava para lá, a descida era muito mais íngreme do que me parecera, o sol abrasava já blocos de terra vermelha em ângulo reto. O carrinho não estava em curva alguma do caminho. Hordas de veraneantes garimpavam agora a encosta, as suas botas descolavam grãos vermelhos da falésia (já não o Utah mas uma arriba fóssil da Galé): Ruy Belo tirara ali um perfil icónico.  Finalmente no sopé havia uma caverna de Ali-Babá. Lá estava a mala, de conteúdo intacto, mas não o carrinho. A partir daqui o sonho desloca-se para a Califórnia e para o problema "do nível da água na esfera terrestre." Eu começara  a ler A Divina Comédia na tradução de Marques Braga e adormecera a pesar a vantagem de substituir fatal por fetal num terceto repleto de feras.

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