outro poema de Ady Endre traduzido por Ernesto Rodrigues, e que foi silenciado por alfnete, apesar de ter andado a rondar a página
MULHERES NA PRAIA
Estavam na praia mil mulheres,
tendo seus lenços, e com flores,
que soluçavam nos adeuses,
e eu no barco jubilei.
Veio crepúsculo; em névoa,
estavam na praia mil mulheres.
Mas inda vi os lenços delas,
mas as flores inda caíram.
Veio a noite e escureceu,
como o passado, qual vingança;
estavam na praia mil mulheres,
e eu no barco que chorei.
Porque não via já nenhuma,
nem sequer lenços, flores sequer,
e ouviu-se assim, qual numa história:
«Estavam na praia mil mulheres».
6 comments:
Magnífico. Já agora, qual a autoria da pintura?
Pablo Picasso, "Duas Mulheres Correndo na Praia", 1922
Bj
Muito obrigada. Não sei porquê, mas quando o visionei a primeira vez, tive a sensação de o reconheer. Estava errada, porque associei-o ao Álvaro Cunhal, acho que pelas mãos e pelos pés.
Idem.
Muito bom! A tradução dá-nos deliberadamente a ilusão de que este podia ser um poema da literatura portuguesa: o tema, os motivos, o metro usado, a repetição, o ritmo construído (etc.) apontam nesse sentido.
Tendo gostado muito desta recriação portuguesa do composição, levanto um problema clássico dos estudos de tradução. Será que esta versão em língua portuguesa do poema não peca por evitar (por esconder) o "carácter estrangeiro" da composição, tão português ele nos soa?
Claro que esta heresia é feita em modo de provocação. Sem poder ler o original, muito me agradou a versão portuguesa.
Parece uma pertinente questão académica. Mas e se nos perguntarmos: cada tradução é uma versão não é verdade? Cada uma delas pode ser apreciada como versão que é... com o que tem do original e o que tem da tradução. É por assim dizer um produto manufacturado... no fim de contas, como a aparentemente simples água que hoje se bebe, que passa por milhentas operações nas estações de tratamento. Também podemos bebê-la da fonte, mas cada vez mais é dificil ir ter às fontes :-) - alguma coisa, n'importe quoi, tratou de as secar, responsabilidade comum deste mundo em que vivemos e que consumimos. Assim, somos livres de consumir a água A, B e C (ou todas) e também gostar muito do poema X vertido para português por este ou aquele tradutor (frequentemente poeta) e apreciar da mesma forma a versão menos aportuguesada de outro tradutor (ou do mesmo...)
concordo com o que quiserem, mas os progenitores estão sem net e não ma deixam cracar... Por isso, só posts secos e enxutos, por ora.
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