Tuesday, November 23, 2021

A Revelação Mosaica

 El poeta, inmerso en el movimiento del idioma, continuo ir y venir verbal, escoge unas cuantas palabras – o es escogido por ellas. Al combinarlas, construye su poema: un objeto verbal hecho de signos insustituibles e inamovibles. El punto de partida del traductor no es el lenguaje en movimiento, materia prima del poeta, sino el lenguaje fijo del poema. Lenguaje congelado y, no obstante, perfectamente vivo. Su operación es inversa a la del poeta...

Octavio Paz, Traducion: Literatura Y Literalidad

 


Um pulmão rosa aflora outro pulmão cor 

de pele

um torso bege namora um bosquejo

de coração ou molde 

de púbis feminil

por baixo um rosto de homem seu chapéu oval

farejando tudo 

num mapa deflagrável nos estilhaços

do material cintilante sigiloso

negro

 

era isto que eu via prolongando o tempo 

na sanita

eu menina cruzava os grifos que havia 

no padrão tosco do mosaico 

cujo nome há de ser pertença do mundo

da construção civil 

(termos relacionados

grés 

lambaz 

tessela)

decifrar era a indagação daquilo que conversava

o chão consigo

 

talvez pensasse que o chão era a cabeça

da terra ou que o mosaico falava 

e as formas eram bocas a buscar a cor

o alvo de um acento

talvez não pensasse

creio em palavras que soube primeiro n’As Mais Belas

Histórias da Bíblia e na catequese

sarça 

maná 

profeta

contratos de cedência

entre homens

bonecos que apagava o dedo de Jesus no terreiro 

em frente à fúria de lapidação da mulher 

adúltera

 

Cada lasca

tinha mais línguas do que o céu o meu exercício 

era isso 

línguas ainda não palavras nem

ainda linguagem pendurada em árvores

sintáticas


só um diagrama infantil de forca

a terminar as patas de uma rola cantando

 

ainda expressão

incomum sem comunicação genérica

ainda só sentidos ainda

só paleta só pauta

e o tempo da diferença a dissuadir o tácito

convénio da gramática

 

mais variáveis

do que regras

 

quando eu era menina relacionava assim

as formas na retrete e se retraçava

de mirada absorta

nem de perto nem

de longe a vida

e a sua pantomina

se praticava

o desejo partido de coisas

abjetas quem me dera 

 

hoje

essa tradução de

morada tosca escondida

anterior

 

a poetas

Thursday, November 04, 2021

Re volta


Cem dias ao ano o banho

em curso de água frio corrente—

Coisa da revolução

e o mundo: o desejo 

de encontrar outra pele

mais funda que a língua

lambente

Deixar os cigarros sempre

mais bicudo que manifestar-se

por uma salvação verde.

Estender após lançada a linha 

aos de bruços na amurada:

importância em queda

zunindo, cortante, uma lâmina

de prata, um pano preto, quanta jangada

a morrer na praia, quanta vaga

levantada por inércia. Que alague

os livros e queime e abale solo e onda

a prumo, o ataque, o pirata

misericordioso que acabe rápido

com este tormento: maré

vaza, estopa e fogo nesse conceito

mimoso do sujeito

suposto saber, dengoso

de amor e ocidente (aquele morrer

na praia); maré

cheia, briga, motim, ir de novo

logo vir à tona, quanto custa

esta história de singrar 

no mar (além do floreio obsceno)

cortar-lhe a vela na raiz, repor, rodopiar

o tabuleiro do jogo da solitária, do assentamento

na sofrência injusta e inglória:

desnaturar o privilégio  largar

a má onda de ser infeliz.

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