Quando eu nasci a
última guerra mundial tinha sido há vinte e cinco anos
a colonial ainda
tinha minas
a minha idade é
mais do dobro desse tempo nesta paz
sinceramente agradeço
mas as coisas não convencem
como a tosse sempre
na garganta o escorrega acentuado
da esperança e
viver como julho temporão quando passou
já o dia mais
longo custa trabalhar o vento tem grão a lua
zomba amarela
cada hora mais matrona as melgas rondam todas
as atividades
parecem besuntadas de creme contra
a exposição solar
as picadas do peixe-agulha a comichão
da caravela
portuguesa não é a sabedoria que se ganha
a ternura que se
conquista uma ova é esta película
de gordura entre
nós e o mundo os tornozelos
inchados no lodo
do mar morto
a sabedoria aliás
não tem nada que a recomende
eu que o diga que
fiz estudos
ganhei uma
cadeira de armar à sombra da academia
e quando o rei
faz anos espremo as tetas
da poesia de cada
vez o leite é mais ralo
o soro nem vê-lo de
resto dane-se para quê
a inoculação? já agora
o direito internacional que nos vale
as costas
direitas para dizermos que não cabem
não há cais nem margem não há cá piedade
que chegue para os povos das
partes baixas do mapa
felás infantis
logo querulentos garotos famélicos
grávidas
desidratadas gente que nos olha
por cima da
burra com pragas e mil vícios
isso não é bonito
vêm com o
pacote agora desembrulhe-se
tanta hubris esta
bílis se calhar é o valor fiduciário
sei lá eu sou das
letras tudo passa
sem os meus
palpites a minha pieguice pouco faz
em justiça nem
sequer dá alívio o que eu devia
não era reclamar era
convocar o imoderado dilúvio
quando não a
mocidade a inocência
chamar com a fé
decorosa da oração
inundada cheia que
valha nos esparza
nos faça anfíbios
entre os anjos e os bichos
sei lá eu fácil
saída fraco remédio
para a catástrofe
unguento inócuo da
nossa dor
se calhar faz
parte do problema
o pejo conservador
que no poema se cante
um exultante afogamento
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