Gosto de terraços, andares
elevados
com vistas de luz, horizontes
de ondas, certas asas contra
céu de lilás nublado ao ocaso
da ponte no regresso
ao cosmos como conchas de
íris, colchas de retalhos
do turvo coado quando se
separa a limpidez
Gosto de sossegados mirantes
com reflexos róseos
gasosos
de espumante
Nunca quis uma herdade uma
horta um herbário
por mais que me comovam os
sobreiros nos montados
as azedas claras prímulas
margaridas zonzas borboletas
a seda em especial
dos cravos, a surpresa vermelha das papoulas
Meu campo de há muito é a
minha bicicleta
com um desígnio de duna ao
fundo e por baixo dela imensa
a rouquidão do mar meu
esforço de corpo penetrando-o
a frio, em pelo, até à solução
da sede na pesada
transparência
Aquartelei temporariamente em
barcos onde conheci o mergulho do alto
no azul traçado por apitos de intangíveis mamíferos
e namorei marinheiros motards
estrangeiros
eruditos oitocentistas com
pretensão de artistas
amantes de música que
dedilhavam os instrumentos
para me afastar dos amigos
que voltaram quase sempre
com motejos de bobos suicidas
— generosos bombos
espalhafatos de bolbos e
urtigas
Também gosto de comboios e
dormi duas vezes
com um maquinista de
elevadores
fora o fraco que tenho por
designers, fotógrafos
documentaristas, operadores
de câmara, que sendo meio
cega lhes animo deslumbres
pornográficos
ao passo que a mim convêm os
disparos (nem sempre
acabei por cima, vezes houve
força que me pôs de rojo me
suprimiu ar
embora hoje a carne fale
menos ou cale quase
posso regular melhor aprender
a domar
vaipes abortar rancores tendo
remorsos vários
a idade é um poço mas dá à
viagem da dor o antídoto
da bondade se bem que raramente veja nisso vantagem)
Recordo ainda quando fui
gajeira subi a
enxárcias até ao cesto onde
comuniquei
por morse as manobras ao meu
primeiro interesse romântico
e ele pouco após
sucumbiria de vício que eu
não sabia
mas uma vez se tanto escalei
uma árvore
para me pedires abrigo naquele
cair da tarde
contigo — não numa casa foi
um quarto
numa pensão ronceira à
praça com o nome mais nítido
da cidade prometida
no cimo da colina onde fizemos amor contra
lavabos
sem asseio contra
telhas esconsas de musgo a
chuva miúda contra
o termos acreditado ternos e
marcados que o
iríamos repetir por toda a
vida
Se eu fosse comedida nesta
cena pararia o balanço
e por que não? vou ser
se parece o poema conseguir
aqui um pouco
endireitar o torto
na confissão não se canta em
revista ao que se deu
e desfez não basta não nos
oferece pena para saber
nem a parte mais díspar e
rápida
e sumida
do que nos intriga ou ferindo
ressuscita