Sunday, November 15, 2020

Cessa as Lágrimas

[as letras desta mulher dão-me a mesma emoção de Paul Celan; mas neste caso, putas de lyrics, devem ser as letras + voz e música, ou o fenómeno do cantado não sustentar a letra de forma; experimentam-se liberdades—poucas, e hesitações—muitas]

Nunca me casarei meu amor:

Morrerei à espera das badaladas.

Anda, morte, levanta-me da água,

Do Inferno já não temo nada.

Nasci no dia em que o ano era novo.

Nasci com um dom no ouvido.

Alguém roubou toda a água.

Guardo na urna os comprimidos.

Senhor, mostra-me a minha filha,

Como era sem ter ardido.


Damos passeios pelos corredores.

Às vezes ouve-se tocar uma ária,

Às vezes pendemos dos quartos

Para entardecer à Baudelaire.

 

A rosa amarela é forasteira,

O convite do diabo coroado.

 

Ponho-me a olhar o meu quarto:

A tralha no chão em volta,

A faca preparando o massacre,

A Virgem pendurada na porta.

 

Aproximo-me da fronteira da morte

A reclamar a capa que Deus me rasgou.

 

Estou com o bebé junto ao rio

Para onde o pai salta de imediato:

Segura-lhe a cabeça sobre a água,

Tão pálida contra o regato.

 

Sou cavalo em que monta a filha desse pai.

Ele é a montanha que está por baixo.




1 comment:

hmbf said...

Excelente.

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