Tuesday, March 07, 2006

Female Bonding #2

A MORTE DE SYLVIA

Sylvia, Sylvia,
com um estojo morto de pedras e colheres,

com dois filhos, dois meteoros
à solta a brincar num quarto estreito

com a tua boca contra o lençol,
contra a trave do tecto, contra a muda prece,

(Sylvia, Sylvia
para onde foste
depois da tua carta
de Devonshire
sobre plantar batatas
e criar abelhas?)

por que causa te ergueste,
e como precisamente te afundaste?

Ladra –
como pudeste esgueirar-te

acocorar-te sozinha
nessa morte que eu queria tanto e há tanto tempo,

a morte que ambas dizíamos ter vencido,
a que guardávamos nos peitos escanzelados,

de que falávamos tantas vezes de cada vez
que emborcávamos três dos mais secos martinis de Boston,

a morte que falava de analistas e de tratamentos,
a morte que falava como noivas entre tramas,

a morte a que bebíamos,
as razões e o gesto taciturno?

(Em Boston
a moribunda
corrida nos táxis,
sim outra vez a morte,
na corrida para casa
com o nosso menino.)

Ó Sylvia, recordo o tamborista sonolento
que tocava nos teus olhos com uma história antiga,

como queríamos deixá-lo vir
como um sádico ou uma fada de Nova Iorque

fazer o seu serviço,
uma necessidade, uma janela numa parede ou num berço,

e desde então ficou à espera,
debaixo do nosso coração, do louceiro,

e vejo agora que o vamos cumulando,
ano após ano, velhas suicidas

e conheço ao saber da tua morte
um terrível gosto disso, como sal,

(E eu,
eu também.
E agora, Sylvia,
tu outra vez
com a morte outra vez,
a correr para casa
com o nosso menino.)

E limito-me a dizer
estendendo os braços para esse lugar de pedra,

o que é a tua morte,
senão uma antiga pertença,

uma verruga caída
de um dos teus poemas?

(Ó amiga,
enquanto a lua é má,
e o rei partiu,
e a rainha treslouca,
que cante o cocktail espumante!)

Ó diminuta mãe,
também tu!
Ó estranha duquesa!
Ó coisa loira!

Anne Sexton, 17 de Fevereiro de 1963
Tradução às três pancadas: a dificuldade está na morte ser masculina em inglês; "o meu menino" ("my boy") é essa morte. Aceitam-se sugestões.

3 comments:

lebredoarrozal said...

ontem estive a ler este poema e estive mesmo para te oferecer a tradução

Luís Serpa said...

Tente "trespasse"...

dama said...

Luís Serpa, bem-vindo. "Trespasse", acho eu, resolve o problema do género mas destrói a crueza do conceito. Obrigada.

Blog Archive

Contributors