Encontraste o primeiro namorado no passeio da rua iluminada. Trazia a família, desdenhosa, com ele. Tu também tinhas a tua. Era à porta de um cabaré onde tinhas ido com A. e suas amigas. Antes combinaras com a tua professora de piano recomeçar as aulas, seria depois do cinema, à meia-noite, mas era óbvio que não chegarias a tempo. Caía uma fita de papel. Dizia Le Déclin du romantisme. Aí entrava outro velho mentor, de quem gostavas, mas embaraçava-te que ele testemunhasse a tua falta de coragem. Era ele quem sabia que não tinhas conseguido saltar de um muro ao outro num ângulo de queda absurda. Cassady preenchera a falha no declive para que Ginsberg o fizesse. Kerouac fizera-o separando o fígado como uma bola lançada, depois com uma palhinha chupando-se de volta. Isso vinha no On the Road II, integrado por sua vez no tal Déclin du romantisme, de que também havia exemplares com o título Le Romantisme du romantisme. O teu velho mentor só queria que te soltasses um pouco. O teu velho amante era bom de abraçar, não tinha mudado. Guardara todos os bilhetes que lhe mandaras ao longo dos anos, nunca lhes respondera mas investigara sobre eles. Por exemplo, a foto de duas meninas anorécticas, uma notícia sobre a teoria da terra perfurada. Lamentava que te tivesse faltado a maturidade, agora era tarde, e tu ficavas ali no corpo dele a pensar o que fazer com as miúdas lá dentro, hesitando sobre bater à porta da velha professora, imaginando-a pesarosa no primeiro andar de onde não se podia mexer, interrogando o que seria preciso para desfazer a incapacidade de saltar entre dois muros, tentada ao subterfúgio de pular as páginas do livro e achando-te, por isso, falsificadora.
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