Tínhamos uma coisa para fazer na Itália
e, cheios da
impressão de nós
próprios (essa
sensação de sermos
poetas da
América), lá fomos
de Roma a Fano,
conhecer o presidente
da junta,
desenvolver
uns quantos
assuntos (o que é
cheap date, perguntaram, o que é
flat drink). Reconhecemos, entre os letrados
italianos, os
nossos congéneres:
o académico, o
apólogo,
o arrogante, o
temerário,
o apaixonado, o
catavento — e havia um certo
delegado (o
conservador), de fato
de cerimónia
cinzento, que parecia um bom guia
com passo
ponderado e timbre lacónico narrando
histórias e
vistas por onde nos carregava a carrinha.
De todos, era o
mais politico e o menos poético,
ao que parecia. Nos
poucos dias restantes em Roma
(fugidos todos os
Bardos do Novo Mundo menos três)
achei um livro de
poemas escritos
pela
desinteressante criatura; estava
no quarto da pensione
(que ele recomendara)
onde fora talvez
abandonado pelo
tipo da Alemanha
(teriam eles um autocarro?)
a quem o dedicara
e datara de há um mês.
Eu por sinal
também não lia italiano, pelo que devolvi
o livro ao escuro
do armário. Nós os últimos Americanos
devíamos partir
amanhã. Então para a noite de despedida
o nosso anfitrião
escolheu um restaurante do tipo familiar
onde nos sentámos
à conversa, nos sentámos a comer,
até que, ao
dar-nos conta da nossa última
grande
oportunidade de sermos poéticos, de deixar
marca, um de nós
perguntou
“O
que é a poesia?”
É a fruta e os
legumes e o
mercado do Campo
dei Fiori, ou
aquela estátua?”
Como eu era
o cata-vento,
descobri logo
a solução, sem
ter de pensar — “A verdade
é ambos, ambos”
regurgitei. Mas isso
era fácil. O mais
fácil de dizer. O que se seguiu
ensinou-me algo
sobre a dificuldade
pois o
subestimado anfitrião tomou então
de repente a
palavra, com crescente paixão, e disse:
A estátua
representa Giordano Bruno,
que levaram a
queimar na praça pública
por via da ofensa
que fez à
autoridade, quer
dizer
à Igreja. O crime
dele foi ter crido
que o universo
não gira em torno
do ser humano: não
ser Deus nenhum
ponto fixo ou
governo central, antes
se derramar em
ondas através das coisas todas. Todas
se movem. “Se
Deus não é a alma em si, Ele
é a alma da alma
do mundo.” Tal foi
a sua heresia. No
dia em que fizeram
que marchasse
para a morte, temiam
que incitasse a
multidão (tinha fama
a eloquência do
homem). Por isso os captores
colocaram-lhe
sobre a cara
uma mascara de
ferro, ele de trás
não podia falar.
Foi assim
que o queimaram.
Foi assim
que morreu: sem
uma palavra, frente
a toda a gente.
E a poesia—
(já todos nesta
altura tínhamos
pousado os garfos, para ouvir
o homem de
cinzento, e prosseguiu
em voz baixa)—
a poesia é o que
ele pensou, mas
não disse.
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